EM MEMÓRIA A SEU FRANCISCO CAMARGO
A
notícia do falecimento de Seu Francisco Camargo(1937-2020), pai da dupla
sertaneja Zezé Di Camargo & Luciano na noite de segunda-feira, 25 de Novembro de 2020, aos 83
anos de idade, após passar dias internado depois de sofrer uma parada
cardiorrespiratória, gerou uma grande
comoção no Brasil inteiro. Mesmo ele não sendo um artista famoso como os
filhos. E isto tem uma explicação, muito
disso se deve ao fato de que ele foi um homem muito importante para investir,
incentivar e impulsionar na carreira
musical dos dois e os ajudou a alavancar no primeiro sucesso deles que foi com É
O AMOR. Um homem simples do campo,
depois que os dois filhos ficaram nacionalmente famosos, ele sempre
procurava se manter reservado longe dos holofotes públicos.
Isto
mudou, quando ele teve sua história contada no filme 2 Filhos de
Francisco(Brasil, 2005), que foi bastante lembrado durante as notícias
que circularam pelo Google e Feed de notícias das redes sociais como Facebook, Twitter e Instagram durante a cobertura do seu enterro, onde
alguns atores que fizeram parte do
elenco do filme manifestaram seus pêsames ao seu falecimento, onde foi a partir
de então que ele acabou virando uma respeitada figura pública.
Coincidentemente,
esta obra fez debutante em 2020,
completando 15 anos que foi lançado e foi o grande fenômeno do cinema nacional.
Sendo um grande campeão de bilheterias do cinema brasileiro na época.
A
obra aos olhos de hoje envelheceu bem, pelo fato de justamente tratar do tema
universal sobre os valores familiares do ser humano. Contou com a direção de
Breno Silveira, fazendo sua estreia como diretor principal, após vim de um
longo currículo como diretor de fotografia em grandes produções nacionais como: Carlota Joaquina-A Princesa do
Brasil(1995), Traição(1998),
Gêmeas(1999), Eu,
Tu, Eles(2000) e O Homem do Ano(2003), fora as direções
em campanhas publicitárias e nos videoclipes de grandes artistas musicais brasileiros dos quais foi bastante premiado
pela MTV e também foi produtor associado
do filme Casseta & Planeta: A Taça do Mundo é Nossa(2003).
Trata-se
de um excelente filme, que mesmo sendo uma cinebiografia da mais importante
dupla sertaneja do Brasil, se concentrou mais o protagonismo na figura de Francisco. Com
roteiro escrito por Patrícia Andrade e Carolina Kotscho, o diretor chegou a
confessar na posteridade que ficou muito receoso quanto a aceitar o convite
para dirigir, visto que o estilo musical da dupla não era da preferência dele.
A
trama aborda diferentes camadas sobre a trajetória da dupla, que começa na
premissa quando Seu Francisco(Ângelo Antônio) trabalhando como lavrador e sua
esposa Helena(Dira Paes) esperando a chegada
do primeiro filho Mirosmar, o primogênito que vai assinar futuramente
como Zezé Di Camargo, em Pirenópolis, no sertão de Goiás em 1962.
Ele
já mostrava um sonho quase que impossível e um tanto mirabolante, de transformar
dois de seus nove filhos numa dupla sertaneja. Ele tenta botar em prática isso
no seu primogênito e com o outro filho Emival. Ele presenteia Mirosmar com uma
sanfona. Onde ele mostra os seus dotes artísticos ao fazer pequenas
apresentações em feiras. Para eles conseguirem chegar ao topo de virar a mais
consagrada dupla sertaneja ganhando rios de dinheiro não ocorreu assim como num passe de mágicas da noite para
o dia. Passaram por muitas provas e desafios. Quando tentam se apresentarem num programa de
rádio onde são chamados de Camargo & Camarguinho, são zombados pelo
radialista e pela plateia ao cantarem uma canção exaltando a Ditadura Militar
no Brasil. E o radialista os manda embora dizendo para eles não cantarem aquela música jamais na
rádio, pelo medo dos militares invadirem
a rádio e a tirarem do ar.
A
vida modesta dele no campo irá mudar quando é mostrado ele brigando com seu
sogro sobre o terreno, que faz ele tomar a decisão de se mudar na capital e lá
fincar raízes ajudando a sustentar os nove filhos como pedreiro numa construção civil,
onde o pouco que ganhava procurava manter um padrão de vida dos mais
confortáveis para ele, a esposa e os filhos. Enquanto Mirosmar e Emisval não
desistem do sonho e tentam se apresentarem numa rodoviária, onde lá conhecem um
empresário chamado Miranda(José Dumont), que ao observá-los cantando se oferece
para agencia-los.
Esse
sugere uma modificação do nome da dupla, é durante o período da convivência
deles com este agenciador, que ocorre uma grande tragédia que ocorre num
acidente automobilístico quando Miranda estava retornando com os dois depois de
uma apresentação. Neste acidente Emisval morre, e interrompe mais uma vez o
sonho de seu Francisco de transformar os filhos em artistas de sucesso.
Até
que com o passar do tempo, o filme vai
se adiantando em sua rodagem mostrando Mirosmar(Marcio Kieling) já adulto,
fazendo suas apresentações de sanfona em boates. Enquanto que seu irmão menor, Welson,
que após crescer formaria dupla com ele, assinando como Luciano.
Nesta
fase, somos apresentados a forma como Mirosmar foi sendo apresentado a sua primeira mulher Zilú(Paloma
Duarte). Depois vai se adiantando chegando a fase juvenil de Welson(Thiago
Mendonça), um rapaz completamente imaturo da vida que tem um namoro em sua fase
de colegial, desse namoro ele engravida da menina, enquanto que Mirosmar vai
tentar a sorte em São Paulo-SP, junto
com sua esposa Zilú e as meninas.
É
lá que Welson resolve também se mudar após a desilusão amorosa, resolve construir
sua vida lá em São Paulo, onde fica hospedado na casa de Mirosmar e lá começam
a difícil batalha de tentarem conseguirem irem atrás de uma gravadora, com
muitos percalços conseguem, gravam o primeiro LP, onde lá tem uma cena do
produtor explicando para Zezé, que ele só garante o disco, mas não garante o
sucesso. Botando um balde de água fria.
Nos
momentos finais, é mostrado eles voltando para Goiás, onde retornam à casa da
família e mostram-se muito desiludidos, quase desistindo, quando então
novamente Seu Francisco resolve reforçar
ligando num orelhão gastando suas fichas nas rádios para tocarem É O Amor,
convence muita gente que para alegria termina com eles ouvindo na rádio É
O Amor, liderando as paradas.
E
assim a trama é concluída, como bem já adiantei, o mote da estrutura da
história da obra, se concentrou mais no
protagonismo de Seu Francisco como o grande incentivador da carreira da dupla,
ainda que de uma forma um tanto estranha
e questionável como fazê-los
engolir uma gema de ovo para ficarem com a voz afinada para cantarem. Mais do
que basicamente, ser apenas uma cinebiografia da dupla.
O
filme não apresentou o que viria acontecer como consequência para a dupla
depois do sucesso de É O AMOR,
deles se tornando famosos no Brasil inteiro,
se apresentando constantemente
nos populares programas de auditório da TV e recebendo discos de ouro,
prata, platina, diamante, estampando capas de revistas, sendo matérias de
jornais, lotando em suas apresentações ou mesmo conhecendo e fazendo amizades
com outras duplas sertanejas, como no caso dos seus conterrâneos, Leandro &
Leonardo, que no filme aparece uma menção rapidamente a eles numa cena de Zezé
numa loja de discos apreciando o LP da dupla. Estes já estavam bombando na época que eles estavam
surgindo com o primeiro sucesso como
dupla sertaneja na indústria fonográfica brasileira.
Também
não apresentou as armadilhas que eles enfrentaram com o sucesso e a fama tão almejada ganhando rios de dinheiro,
como o pesadelo ocorrido em 1998 quando eles viram seu irmão Wellignton Camargo, que na infância
sofreu de uma poliomielite que o deixou paraplégico e esta passagem dele é mostrada rapidamente no filme, sofrendo um sequestro que durou
longos dias agonizantes.
Enfim,
o enredo do filme se concentrou mais em apresentar a trajetória do Seu Francisco, pai da dupla de como ele foi o grande incentivador da carreira
deles.
Num
belíssimo trabalho de direção e roteiro, somados também ao trabalho impecável
técnico do design de produção,
principalmente nas locações externas, como o cenário bucólico do sertão goiano,
passando pela zona suburbana e as locações de São Paulo, onde em cada uma foram bem trabalhadas diferentes paletas de cores, onde cada uma criava bem um
ambiente atmosférico, das cores mais quentes e estouradas ambientadas no sertão
goiano, para as cores mais saturadas e frias das zonas suburbana.
Some-se
isso as caracterizações dos figurinos, onde cada um simbolizou bem a característica simplista de se vestir dos
protagonistas que retratou cada época
que a obra vai se ambientando. Do jeito caracteristicamente matuto do sertão, para o jeito mais suburbano da
periferia da capital goiana e depois durante a estadia paulista da dupla. Esse toques vintages fez
com que a obra fosse bem trabalhada na
estética kitsch.
Some-se
a isso também ao elenco estelar presente no filme, que contou em seu casting
com nomes célebres de novelas como Ângelo Antônio na pele do seu Francisco agindo
com a típica figura do matuto com característica
rústica. O ator mostrou um bom desempenho dele como patriarca
que sonhava alto em transformar os filhos em artistas. Dira Paes na pele da
matriarca Helena, representou perfeitamente bem ela como contraponto ao marido, tentando botá-lo
com pés no chão no sonho mirabolante dele transformar os filhos em artistas.
Márcio
Kielling, jovem ator egresso da novela teen Malhação, representou
bem o Zezé Di Camargo adulto num lindo trabalho de composição. Paloma Duarte ficou
ótima como a Zilú, primeira esposa do Zezé, muitos anos depois do lançamento
desse filme eles separariam e atualmente Zezé está casado com Graciele Lacerda.
Thiago
Mendonça na pele do Luciano jovem imaturo, também se mostrou excelente, fora as
rápidas participações especiais de feras como Lima Duarte na pele do Seu Benedito,
avô durão da dupla. José Dummont como Miranda, o primeiro agenciador
da dupla antes formada por seu falecido irmão Emisval. Jackson Antunes
mostrando seus dotes de sanfoneiro numa cena de apresentação e os protagonistas
mirins, em especial os que representaram a dupla sertaneja quando eram
crianças. Dáblio Moreira ficou excelente na pele do Zezé Di Camargo e Wigor Lima
como Luciano também esteve incrível.
Enfim,
posso concluir que a obra traz uma abordagem bastante atemporal e emocionante
sobre os valores familiares, principalmente para estes tempos tão conturbados
ela merece ser vista e revista.
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