REVISITANDO
DOIS FILMES NATALINOS DO COMEÇO DO SÉCULO 21.
Nesse
clima natalino, para minha surpresa eu tive o privilégio de assistir a um filme
bastante diferente na Netflix que foi Tudo
Bem no Natal que Vem (Brasil,2020), uma produção nacional estrelada
pelo Leandro Hassum original da Netflix. Algo inédito no cinema brasileiro.
Também dei uma conferida na Netflix em dois filmes que eu já havia assistido
antes, mas que com outro olhar bem pude perceber quais diferenciais eles carregam após
minhas revisitada por elas. Os dois
títulos em questão tratam-se de O Grinch (How
the Grinch Stole Christmas,EUA,2000) e O Expresso Polar (The
Polar Express,EUA, 2004).
Ambas
produções americanas que trazem uma abordagem natalina usando logicamente pela
ótica do estilo American Way Of Life de como os americanos
costumam comemorar sua data natalina, em
especial no costume de brincar na neve, o que faz sentido pela verossimilhança
da localização geográfica do território ser próximo das calotas polares e como
neste período lá é a estação invernal, o
que torna bem comum o cinema apresentar os americanos esculpindo também os bonecos
de neve.
Ambas
também carregam em comum o fato de terem sido adaptações de obras literárias de
autores americanos e ambas foram lançadas
lá pelo ido dos anos 2000.
Mesmo
tendo a coincidência da mesma abordagem,
o mote da estrutura de história de ambas é completamente diferente.
Em O Grinch (How the Grinch Stole Christmas,EUA,2000), filme baseado no livro de Theodor Seuss Geisel, que costumeiramente assinava autoralmente como como Dr. Seuss(1904-1991) publicado em 1957.
Conta a história de uma criatura verde chamada de Grinch(Jim Carey) que
nutre um imenso ódio pelo Natal, isso porque ele desde a infância sofria muita
gozação da população da Cidade dos
Quem por ser diferente com uma
aparência feia de pele verde e peluda, já que foi trazido bebê por uma cegonha que
o deixou aos cuidados de duas senhoras. Durante sua infância nutriu uma forte
paixão por sua colega de classe Martha May Whovier(Christine Baranski), uma das
importantes e conceituadas damas do povoado dos Quem, quase uma socialite, onde
ela sempre desperta um flerte do Prefeito Augustus May Who(Jeffrey Tambor), uma
autoridade com porte físico
rechonchudo, cuja personalidade era de um
sujeito rude, arrogante, prepotente e muito vil e desprezível que conheceu o Grinch na infância quando foram
colegas de sala, onde lá ele era tipo um valentão que vivia o provocando
principalmente o seu rosto cheio de pêlo, em consequência desses bullyings
chegou a ponto dele viver odiando o Natal até chegar
a fase adulta, quando cresceu isolado do povoado vivendo como um ermitão numa
caverna na companhia de seu cachorro Max, que vive tentando sensibilizá-lo para
o natal.
Mas
ele se recusa a entregar-se ao
sentimento natalino, deixando seu coração diminuído. Ele se tornou uma figura
lendária na região que muita gente do povoado dos Quem passou a ter medo só de
ouvir falar no nome dele.
É
então que uma menina chamada Cindy(Taylor Momsen), filha do carteiro da Cidade
dos Quem Lou(Bill Irwin) resolve se arriscar a ir atrás do Grinch para usar de
sua pureza para tentar sensibilizá-lo. Uma ideia que toda a população dos Quem
se mostra contra e a confusão já está dada.
Já
com relação a O Expresso Polar(
The Polar Express, EUA, 2004), o filme assim
como O Grinch também foi inspirado num livro homônimo publicado em 1985,
cuja autoria é do também americano Chris Van Allsburgh, autor de
best-sellers que foram adaptados para o cinema como Jumanji (EUA,1995)
e Zathura (EUA,2005).
O
filme começa contando a história de um garoto que se aventura a andar num
expresso para ir conhecer o local onde mora o Papai Noel e onde são fabricados
os brinquedos favoritos, acompanhado de outras crianças e sendo conduzido por
um excêntrico condutor. Onde ao longo desse percurso ele vai se deparar com alguns perigos e entraves
em sua jornada pelo expresso para ir
chegar até o Papai Noel. Num mote com pegada meio road movie nos trilhos
nevados.
A
respeito de ambas as obras que abordam temáticas natalinas o que posso descrever de diferencial que elas
apresentam. O Grinch contou com a direção de Ron Howard, que aqui
enfrentou grandes problemas para a execução do seu trabalho nos bastidores, em especial, com as duas
empresas que negociaram a compra do direito de adaptação da obra que foram a
Universal Pictures e a Imagine Entertainment, já que eles só começaram a
negociar a compra do copyright da obra depois que Seuss faleceu em 1991, em vida, ele
sempre se posicionou contra a ideia de ver suas obras serem adaptadas por
Hollywood, com exceção de algumas produções animadas para TV. Depois da morte
do autor, Audrey Geisel(1921-2018) viúva
do autor foi quem se encarregou de negociar
com as duas empresas cinematográficas que estavam interessadas na produção, uma
negociação que acabou não sendo nada fácil. Já que além de aceitarem as altas exigências monetárias dela, como os US$ 5 milhões
de dólares em dinheiro, tendo 50% de ganho com o merchandising, 70% de ganhos
nas vendas dos livros e 4% da bilheteria. Tanto a Universal, quanto a Imagine
ao conseguirem negociar essa compra, tiveram
de ceder com a participação dela nas decisões
criativas a respeito da obra.
Uma
delas foi que ela exigia que o ator escolhido para representar O Grinch
tivesse uma estatura comparável ao personagem do livro, e ela então listou quatro nomes de grandes estrelas de sua
preferência estavam: Gene Hackman, Dustin Hoffman, Jim Carrey e Robin Williams.
Acabou que Jim Carey terminou sendo o escolhido, e foi uma boa escolha mesmo. Carrey
na época figurando como grande estrela de sucesso em filmes de comédia,
representou bem em cena o papel principal ainda que tenha ficado irreconhecível
pela caracterização bastante realista feita pelo maquiador Rick Baker que foi
toda desenvolvida usando pelos de iaque e com uma máscara bem orgânica que mostrava um
realismo bastante medonho de ver de tão feio que ficou. Carrey chegou a
enfrentar o grande inferno que foram os longos dias intensos de gravação, e que
para conseguir superar o transtorno ouvia muito Bee Gees quando tinha folga. No
entanto, o resultado acabou sendo compensador visto que o ator imprimiu bem ao
papel aqueles seus típicos maneiros característicos de representar explorando
muito do humor físico e nas caretas que sempre foram suas especialidades. Na
obra, ele imprimiu muito bem isso no personagem, principalmente na forma
excêntrica e irreverente dele agir afetado,
rude, grosseiro, mal-humorado e bastante
espalhafatoso. Há também de destacar a
participação do ator anão Josh Ryan Evans que representou bem no filme o papel
do Grinch criança que faleceu precocemente com 20 anos em 2002 em consequência de
uma doença cardíaca congênita.
Do mesmo jeito que o diretor Ron Howard enfrentou um trabalhão pesado com sua equipe para escolher uma boa locação para recriar a cenografia lúdica da Cidade dos Quem, as caracterizações e figurinos bem extravagantes e caricatos dos outros personagens que habitam o povoado também não foi das tarefas mais fáceis de serem produzidas. Juntando ao trabalho da pós-produção em fazer montagem e editar na parte de fotografia e arrumar umas boas paletas de cores que dessem um tom agradável ao filme, para tornar o filme bastante lúdico.
Um
ponto curioso a se observar é que todos os habitantes da Cidade dos Quem
ficaram com os narizes bem pontudos, um ar caricato e até bastante cartunesco. Com
exceção da menina Cindy, que na obra foi
representada por Taylor Momsen, então na época uma garotinha de apenas 6 anos,
que mostrou um bom talento artístico virando cantora depois que cresceu.
Quanto
a O Expresso Polar, obra contou com a direção de Robert
Zemeckis, diretor de longa carreira de filmes premiados. Este filme
proporcionou uma incrível sensação mágica com uma qualidade técnica ousada e
experimental de ser produzida completamente
em animação digital onde boa parte dos atores, como o astro Tom Hanks, as
crianças no expresso, os duendes e o Papai Noel terem ficado com uma aparência caricata
parecendo bonecos moldados para manequim, o que gerou até na época umas críticas
negativas. Na única vez que vi ao alugar em DVD quando ainda existia videolocadora,
lembro de ter me impressionado bastante, apesar da estranheza inicial. Ainda assim a qualidade artística do filme não
ficou tão prejudicado. O Expresso Polar foi o segundo filme que Tom Hanks estrelou do diretor
Robert Zemeckis 10 anos após ter protagonizado o histórico Forrest Gump-O Contador de Histórias(Forrest
Gump, EUA,1994) onde ganhou o Oscar de melhor ator e teve sua trilha sonora assinada
por Alan Silvestri que também fez a trilha sonora de Forrest Gump. Neste filme,
apesar de sua interpretação ter ficado um tanto artificial, ainda assim
ele mostrou uma boa desenvoltura para encanar os diferentes personagens ao
longo do filme. A meu ver, o filme conseguiu unir boa qualidade artística com a
qualidade técnica.
Mesmo
com suas estruturas e estéticas de histórias completamente diferentes,
ambos em comum trazem a abordagem do natal com aqueles toques de escapismo mais
fantasiosos e um tanto lúdicos, e ambas representam produções lançadas lá no
começo do século 21, que parece que foi ontem que estávamos naquela expectativa
para a chegada do Novo Milênio e sonhando com um mundo melhor. Que sério já se passaram vinte anos.
Analisando
a importância atemporal que cada uma representou e de legado depois de ter revisitado ambas estes dias na
Netflix nesse clima natalino, tipo O Grinch, eu lembro de assistir a primeira vez quando passou na TV e tinha gostado e ao dar uma revisitada nessa
obra pude constatar que a sua estética envelheceu bem, mesmo não tendo
apresentado nada de inovador, de conceitual, de experimental como foi no caso
de O Expresso Polar, lançado quatro anos depois. Principalmente
pelo texto apresentar muito mais do que uma abordagem escapista sobre a data
natalina com tom puramente divertido, também apresentou umas sutis críticas a
representação do natal como data comercial, que era uma coisa que o Grinch mais
detestava, não a sua representação de harmonia e união familiar, mais sim os apreços
pelas futilidades materiais e o Prefeito
Augustus mais simbolizava esse tipo de representação, do mesmo modo que a Martha também simbolizava e a boa da
população dos Quem também. Fora que também o filme abordou, muito antes desse
debate se tornar público sobre as consequências que a discriminação que ele
sofria na infância dentro da escola por ser diferente, e sofrendo de uma prática
abusiva de bullying de um menino valentão que ao virar adulto, se tornou a importante
autoridade da Cidade dos Quem. Ainda que
sutil, mas já mostrava que quando se renega a prática do bullying e quando são fechados os olhos as consequências
disso para a vítima na vida adulta podem serem horríveis e o Grinch representou
bem isso. Ainda mais pelo agravante fato
dele ter crescido como um descompensado
sem a presença de país e foi por umas senhoras muito desajustadas. O que fez
ele crescer insensível e com o coração gelado. E foi graças ao sentimento pueril da menina
Cindy, que fez voltar a sentir novamente o sentimento sensível que ele havia
ignorado.
Com
os efeitos práticos e com o tom da caracterização que fez Jim Carrey ficar com
uma aparência horrorosa e medonha, por essas e outras coloco que o filme
envelheceu bem. Já com relação à O Expresso Polar, ao revisitar
esta obra, pude constatar que o filme apresentou
um mote de história que tipo ok é bastante atemporal, é
emocionante, tem uns problemas ou outros quanto ao desenvolvimento de
personagens que enfim não afetam tanto a mensagem positiva do filme. No aspecto
de história até que a trama envelheceu bem, porém, no aspecto técnico experimental
dessa animação usada em CGI feita em cima
de atores reais, a coisa já muda de figura. E me dói o coração apesar de gostar muito desse filme e descrever
como nesse aspecto de efeitos especiais ele envelheceu mal. Dá para notar bem como aquilo ficou bastante
datado, principalmente em algumas movimentações, o que gera um tom fake. Talvez
isso seja consequência do próprio conceito do vale da estranheza que explica a
sensação que me causou ao revisitar essa obra.
Enfim,
posso concluir que mesmo com suas
diferenças, essas obras tem seus graus
de importâncias em trazer lindas mensagens positivas sobre esta data importante
que é o natal. Ainda mais num momento tão delicado com esta
desgraça de vírus da Covid-19 ameaçando mais vidas então e que esta festividade
desse anos 2020 vai ser marcada pela
situação mais atípica já vista na história
da humanidade.
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