quarta-feira, 24 de dezembro de 2025

NUA, de Saul Dias *

 NUA, de Saul Dias *

.

I

Nua

como Eva.

A cabeleira

beija-lhe o rosto oval e flutua;

o corpo

é água de torrente...

.



Eva adolescente,

com reflexos de lua

e tons de aurora...!

.

Roseira que enflora...!

.

Desflorada por tanta gente...







II

Teu corpo,

mal o toquei...



.

Só te abracei

de leve...

.

Foi todo neve

o sonho que alonguei...



.

Asas em voo,

quem, um dia, as teve?

.

Os sonhos que eu sonhei!



.

III

Jeito de ave

e criança,

suave

como a dança

do ramo de árvore

que o vento beija e balança!



.

Nave

de sonho

no temporal medonho

silvando agoiro!

.

Quem destrançou os teus cabelos de oiro?

.

IV

Corpo fino,

delicado,

sereno, sem desejos...

.

Tão macio,

tão modelado...



.

Beijos... Beijos... Beijos...

.

V

No meu sono

ela flutua

a cada passo...

.

Nua,

riscando o espaço

numa névoa de outono...




.

Apenas nos cabelos

um azulado laço...

.


E assim enlaço

a imagem sua...



.

in "Sangue"

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* pseudónimo de Júlio Maria dos Reis Pereira (Vila do Conde, 1 de Novembro de 1902 — 17 de Janeiro de 1983), poeta e artista plástico, irmão de José Régio.

 


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