segunda-feira, 31 de outubro de 2016

RESENHA DE "O CONTADOR"(2016)










Na noite de Domingo, 23 de Outubro de 2016, fui conferir o filme “O Contador“, acompanhado por meu pai e minha mãe. Nossas motivações vieram, principalmente, pelo fato do protagonista da obra, estrelada pelo Ben Affleck, ser autista e também por eu estar no espectro do autismo, pois sou uma pessoa com a Síndrome de Asperger, e minha mãe estudar esta  condição há muitos anos.  Antes de descrever minhas impressões sobre o filme, começo esclarecendo para os pais e mães de autistas ou mesmo aos profissionais que desenvolvem seus trabalhos científicos da área, que ao lerem este minha resenha critica ao filme não o vejam como um bom exemplo didático para entender o comportamento autista, mesmo porque a maneira como o protagonista representa  é pura obra de ficção sem nenhum compromisso com a realidade, e pode também ser  bastante chocante, assim como sentiu minha mãe que comentou logo após o término do filme, mãe disse “ter tomado um soco no estômago”!.












A trama do filme gira em torno de Christian Wolff que é um autista de alto funcionamento com altas habilidades com números e padrões, e trabalha como contador em um escritório de contabilidade de fachada em uma cidadezinha provinciana. Seu trabalho é decifrar contas e caixas bancários para uma clientela de mafiosos, que o leva a viver uma vida perigosa envolvendo-se em tiroteios e perseguições. As principais características, que são peculiares das pessoas autistas mostradas no filme pelo protagonista, são os rituais representados por ele, como por exemplo, sempre antes de pegar alguma coisa dá umas sopradas nas mãos; sempre que fica irritado, tenso ou nervoso canta uma canção infantil típica americana para se acalmar; assim como, antes de dormir, ouvir música em som muito alto, com luzes piscando e pressiona a perna fortemente, chegando a autoagressão, para aliviar a tensão do dia (dessensibilização).





A primeira sequência inicia na clínica de um psiquiatra especialista no assunto quando o protagonista ainda era criança, mostrando os pais dele conversando com este doutor sobre suas características, enquanto seu único irmão, um pouco mais novo, observa a cena. Inclusive é mostrado que o responsável dessa clínica também tem uma filha autista e oferece acolhimento ao Christian por um período de férias, sem custos para a família. A mãe concorda, mas o pai não! Este diz que as pessoas precisam se preparar para se defender no mundo real e não viver em um mundinho superprotegido.  Em decorrência das divergências em relação à educação do filho, a mãe do Christian vai embora, deixando o pai com os dois filhos.  








No decorrer do filme, vamos sendo apresentados ao modo como o pai conduziu a educação dos filhos, principalmente depois que a mulher foi embora por não concordar com a metodologia de educação militar imposta pelo marido aos filhos. O pai é militar e contrata professores para ensinar técnicas de luta, artes marciais, uso de armas e regras militares para Christian e o irmão mais novo, para torna-los valentes de modo que possam se proteger sozinhos. Por causa dessa desestrutura familiar e educação recebida, o protagonista seguiu um perigoso caminho, motivado principalmente após sua prisão por ter se envolvido numa briga no velório da mãe e lá seu pai foi assassinado. Foi na prisão que ele conheceu seu companheiro de cela, chamado Francis Silverstone (Jeffrey Tambor) que lhe ensinou os truques e passou os contatos dos mafiosos e foi a partir disso que teve inicio sua jornada trabalhando com gente perigosa. E assim, Christian se tornou uma grande máquina de guerra, bom de sopapo e com uma precisão nos tiros tornando-se um atirador de elite.







 O enredo principal do filme ocorre quando ele começa a trabalhar como contador para uma empresa chamada Living Robotics de Lamar Blackburn (John Lithgow), e conhece a contadora Dana Cumming (Anna Kendrick) que está sentenciada de morte após ter descoberto um erro nas estáticas da empresa. Em paralelo, também ocorre umas investigações policiais sobre suas atividades ilegais feitas pela agente Maybeth Medina (Cinthia Addai-Robinson) a mando de Ray King (J.K.Simmons) que a colocou nesta investigação pela obrigação de saber todo o seu passado criminoso na sua ficha suja. Tudo num clima de suspense com uma grande atmosfera de filme de espionagem.




O filme dirigido por Gavin O´Connor consegue cumprir muito bem ao objetivo para o qual foi feito, que é ser puro entretenimento de ação, mesclado com toques de suspense policial. A cereja do bolo para essa receita de sucesso nas telinhas, foi esse tipo de herói com características bem peculiares das pessoas com autismo.  Deu para notar o quanto cuidadoso o diretor precisou ser para não generalizar nem estereotipar modelos, ainda que possa decepcionar em alguns momentos. Mas de resto mostra-se um filme bem despretensioso. Tecnicamente o filme apresenta um tom fotográfico escuro que combina com a atmosfera tensa e misteriosa para prender a plateia, mas para amenizar a tensão também passeia por belos cenários panorâmicos de florestas e bons jogos de câmeras. As cenas de pancadarias estão muito bem coreografadas, mas já são  elementos clichê de filme desse estilo. O roteiro é instigante, envolvente e segue com fluidez. Bem despretensioso, inicia com pitadas de didatismo para explicar a plateia as principais características do autismo, de modo que possam compreender a complexidade do protagonista. Na parte do elenco, Ben Affleck como Christian Wolff está surpreendente neste papel, ele mostra um bom desempenho  ao incorporar  um herói que fora a parte clichê dos heróis de  filmes de ação sendo bom na porrada e  no tiro, demonstra também um bom desempenho ao representar as suas nuances como autista, principalmente na parte das estereotipias, como os rituais de assoprar as mãos antes de pegar em qualquer coisa ou mesmo cantar uma canção para se acalmar e evitar de se auto agredir, ele consegue transmitir os anseios que o personagem apresenta a ponto de mostrar que sua interpretação carrega um peso para  segurar o filme. 






Vale frisar, que o Aflleck já havia vivido outro herói muito especial no filme Demolidor em 2003, como cego. Também destaco a Anna Kendrick como a Dana, que desempenha o papel da moça desprotegida e não passa disso. J.K.Simmons como o agente King que manda a Maybeth investigar Christian Wolff desempenha este papel de uma maneira razoável, mas basicamente a sustentação do filme inteiro fica mesmo por conta do Christian Wolff.  Em um balanço geral, O Contador carrega um excelente enredo voltado puramente para entreter com o clima tenso do suspense, assim como também carrega um teor discursivo sobre o fato do protagonista autista ter escolhido trabalhar num meio tão perigoso como um  reflexo do incentivo do pai dele, e isto não ocorre só com ele, no decorrer do filme é mostrado que seu irmão também escolheu trabalhar nesse ramo perigoso onde o tempo todo sua vida está em perigo, também um  reflexo da educação que recebeu, levando-o a trabalhar como uma espécie de matador de aluguel, bom de sopapo, e com uma precisão nos tiros assim como um atirador de elite.






Reafirmando a recomendação inicial, sugiro não verem o personagem principal como um bom exemplo para compreender o autismo porque esta não é a função do filme. Talvez, a única lição que se pode tirar do filme é que a pessoa autista de alto funcionamento pode se tornar excelente profissional em qualquer área. Conhecendo bem a sétima arte ao qual sou um amante, eles aqui apenas se utilizam do recurso narrativo das licenças poéticas para transmitir puramente diversão ao filme. É o mesmo que você esperar ao assistir aos filmes da franquia Star Wars que eles sirvam de exemplo didático para estudar a teoria física do espaço, ou esperar que Thor, herói do Universo Cinematográfico Marvel nos ensine antropologicamente o modo de vida dos antigos povos nórdicos do qual ele simboliza como uma divindade do trovão. Não se pode esperar que no filme em questão, as pancadarias e os tiroteios no qual Christian Wolff se mete e consegue sair ileso sem nenhum arranhão possam realmente acontecer, assim como todos autistas de alto funcionamento possam se transformar em uma “máquina mortífera”. 





Para conhecer de fato sobre o autismo e síndrome de Asperger, recomendo que procurem informações por meios de profissionais sérios, procurem no Google artigos científicos que desenvolvam este trabalho com mais consistência, bem como documentários sobre o assunto para assim compreenderem como funciona o autismo.  Para finalizar, reproduzo uma famosa frase do jornalista Newton Ramalho na Claquete, sua coluna de cinema do Jornal de Hoje aqui de Natal, ao irem assistir o esse filme, é só “Relaxar, curtir, e apagar o cérebro”.

6 comentários:

  1. Vou assistir na 6a feira... lendo aqui sua resenha... quero que a 6a feira chegue logo

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  2. Realmente assistir a um filme qualquer que seja ele e querer assim entender o autismo não parece ser uma boa ideia.
    De qualquer forma, estou ansioso para vê-lo por que a história parece muito interessante. Parabéns, Breno!

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  3. O filme é incrível!!!

    Sai do cinema estasiada .. querendo veE denovo!

    Concordo com você, Breno, quando coloca que a licença poética permite a "fantasiosa" ideia de como o autismo é tratado.. por outro lado também trás faces interessante se do espectro!

    É um filme que vale a pena!!!

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  4. Adorei o filme. desmitifica a visão romantica de que todo portador de TEA é ingênuo e puro, além de reforçar o papel da educação e da família. Recomendo! PARABÉNS pela resenha!

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