quarta-feira, 24 de outubro de 2018

FAROESTE CABOCLO- UMA CANÇÃO DA LEGIÃO URBANA TRANSPOSTA PARA AS TELAS DO CINEMA


Sempre que se menciona o nome da  Legião Urbana, a principal referência  que deve vim a cabeça de muita gente  é o fato dessa banda simbolizar um estilo musical de som pesado apresentar  umas letras de tom anárquico e transgressor,  cujo principal objetivo era  protestar com duras críticas pesadas à política brasileira. Especialmente no contexto dos anos 1980, onde estávamos passando por uma transição da Ditadura Militar para a Nova República, este estilo de música com som pesado do rock e com letras provocativas representaram um importante legado para a nossa  cultura e são bem atemporais. Basta você ouvir “Que pais é esse” uma  canção  lançada há  30 anos   e você vai observar  como a letra dela   ainda consegue refletir ao nosso tempo atual ainda mais nessa polarização causada pela eleição presidencial então nem se fala. E uma dessas canções em especial  que inspirou o filme que será abordado aqui em questão  é Faroeste Caboclo(Brasil, 2013). 














Com direção de René Sampaio, produção da Gávea Filmes e roteiro adaptado por Victor Atherino e Marcos Berstein.  O filme conseguiu bem traduzir através das cores e das  imagens o que a música composta pelo vocalista da banda  Renato Manfredini Júnior(1960-1996), mais conhecido artisticamente como Renato Russo, cuja origem do sobrenome artístico ele  escolheu como homenagem  a grandes intelectuais que admirava como o filosofo inglês Bertrand Russel(1872-1970), além desses, também admirava o filósofo suíço Jean Jacques Rosseau(1712-1778) e o pintor francês Henri Rosseau(1844-1910). Carioca, nascido no berço de uma família  de classe média,  que se mudou para Brasília ainda adolescente,   quando seu pai um funcionário do Banco do Brasil foi transferido para lá. E foi na cidade símbolo do poder político, então recém-construída por Oscar Niemayer(1907-2012) ainda no Governo de Juscelino Kubitscheck(1902-1976) em 1960, mesmo ano que o cantor nasceu, para servir como residência e reduto de todos os mandos e desmandos que os nossos engravatados da política determinam como tudo vai funcionar  para nossa população. Também serviu como o reduto e o grande berço artístico para Renato Russo se lançar no meio musical. 









A canção Faroeste Caboclo  compõe o terceiro álbum de estúdio da Legião Urbana pelo selo da gravadora EMI intitulado Que Pais é  este, que foi lançado no final de  1987. Renato havia começado  a compor esta canção em 1979, bem antes de formar a Legião com inspiração numa canção de Bob Dylan, chamada Hurricane dedicado ao boxeador Rubin Carter(1937-2014). A canção tinha como característica o fato de ter uma longa duração, com nove minutos, contendo 159 versos sem intervalos dos refrãos, foi uma das canções contidas no álbum que foram  proibidas pela censura  de tocarem nas rádios brasileiras. A canção descrevia  um enredo que contava  a trajetória  de João de Santo Cristo, um fudido retirante da seca do sertão nordestino. Que após a morte do pai por motivo de briga de terras, ele movido pelo sentimento vingativo resolve virar um temido criminoso do sertão  e depois foi mandado para reformatório.  Após sair do lugar foi com a ajuda de um boiadeiro que encontrou na estrada e  disse que estava indo para Brasília, onde ele então resolve ir para ver como oportunidade de recomeçar sua vida. Deslumbrado pela incrível metrópole habitada pelos políticos, especialmente pelas luzes de natal como bem descreve a canção. É nesta cidade que temos contada a jornada dele  para sobreviver, é através de seu primo peruano chamado Pablo que ele entra num caminho fácil de se enriquecer e bastante perigoso que é por meio do tráfico de drogas. É neste interim que ele conhece e fica apaixonada por Maria Lúcia, uma jovem de classe média, que desperta também  o interesse de seu rival do tráfico de drogas  o Jeremias, um playboy de família abastada cujo poder de influencia consegue comprar todo mundo, até mesmo os agente da lei. Tudo isso  vai ser motivo para um último capítulo super trágico. 









Toda a essência do mote da canção foi muito bem transportado nas formas e  nas cores através do filme, tirando algumas passagens de trechos que tiveram de serem cortadas para caber no espaço de tempo e não atrapalhar tanto o andamento do ritmo da narrativa e até com algumas liberdades criativas tomadas pela direção para tornar a obra mais palatável ao público em geral poder imergir dentro do contexto daquela história a tornando bem verossímil. Não só a direção de René Sampaio conseguiu manter esta característica, como também o texto bem adaptado por sua equipe de roteirista nos proporcionou uma história bastante  impecável com toda uma atmosfera barra pesada do inicio ao fim, que se mostrou muito bem casado com a direção de arte que criou uma boa reconstrução de época do panorama  da Brasília  dos anos 1980, bem descrita na música, isto pode ser notado nos figurinos, nas arquiteturas e nas presenças dos carros. Com uma excelente fotografia com paletas de cores em tom seco e sujo, especialmente nas cenas que se passam na Ceilândia criando uma sensação de desconforto escaldante. Um lugar com aspecto rural dentro da nossa capital federal onde reside o nosso Presidente da República e onde trabalham os nossos deputados. Uma terra sem lei, ignorada pelos nossos políticos. Ou seja, o filme traduziu bem a visão crítica da  canção da Legião descrevendo esta outra faceta da nossa  capital federal que é desconhecida da maior parte dos brasileiros, que apenas conhece pelos noticiários da TV mostrando a Brasília que mostra as atuações  dos nossos políticos engravatados não fazendo nada para o bem da  nossa população, ostentando carros de luxo frutos de roubo  e se dirigindo  as gigantescas e suntuosas arquiteturas dos  palácios dos planaltos e dos ministérios.  Eu já tive uma oportunidade de visitar Brasília no final de 2014, quando peguei um voo de escala  retornando de São Paulo. Como o meu voo de retorno a Natal  demoraria, resolvi chamar um amigo que mora há muitos anos lá  em Brasília que  fez a boa vontade de fazer um citty tour comigo pela cidade. Lembro de ter ficado maravilhado em ver de perto toda as arquiteturas dos ministérios ali ao vivo e as cores, coisas que só costumo ver nos noticiários da TV. Inclusive observei o ritual dos desfiles de mudanças de guardas dos dragões  do ministério, todos os prédios modernos, inclusive da primeira igreja e a praça se preparando para a cerimônia de posse de Dilma Rousseff para presidente. E me mostrou outras coisas curiosas  da cidade que não são muito mostrado nos noticiários nacionais, como os  bairros residenciais onde vivem as pessoas comuns. As pessoas comuns que habitam a nossa capital federal estão bem representadas no filme com um elenco estelar formados por famosos astros de novelas da Rede Globo e  bastantes afiados nos respectivos  papeis. Fabricio Bolivera como o protagonista João de Santo Cristo desempenhou brilhantemente em todas as camadas que envolviam o personagem que seguia um caminho tortuoso e sem volta. Você compreende as motivações dele, mesmo que não sejam as mais politicamente corretas, mas mesmo assim torce por ele depois de tudo o que ele sofreu ao longo do filme, principalmente nas mão de Jeremias. Ísis Valverde como Maria Lúcia também mostrou um bom desempenho no papel, ao representa-la na típica figura de uma típica jovem  universitária de classe média vivendo uma vida confortável e com bom caráter, tinha tudo para ter um futuro brilhante, mas,  por causa  da sua vida mundana, ainda mais tendo um pai omisso,  desperdiçou tudo ao se enveredar por um caminho perigoso por causa das farras nas baladas, se  drogando, especialmente após se apaixonar por João. Um verdadeiro caso de amor bandido. Apesar disso tudo, você também consegue compreender as motivações dela, e se importar ainda que este não seja o rumo que ela tomou  não sido o mais correto. Felipe Adib na pele do Jeremias mostrou uma atuação impecável ao entregar muitas características ao   caráter podre do antagonista, para torna-lo um tipo desprezível, abominável, especialmente na maneira como ele ficou bem representado como um típico playboy perigoso, nascido no berço de uma família de elite classuda. Que não mede esforços, e nem mesmo conhece limites para conquistar  os seus objetivos gananciosos com toques de puro sadismo. Endinheirado com as drogas, um pouco nos moldes de Pablo Escobar(1949-1993), o maior chefão do narcotráfico na Colômbia, este ai é capaz de comprar todo mundo até mesmo o delegado Marco Aurélio(Antônio Calloni). Antônio Calloni na pele do Marco Aurélio, o delegado corrupto também desempenhou o papel de uma forma brilhante, ele mostrou uma total entrega ao personagem  que por trás da máscara de agente da lei, também tem um caráter tão podre e tão desprezível a ponto de ser um dos mais odiados da história. Além de agir como um pau mandado do Jeremias, Marco Aurélio também  pratica toda a crueldade com agressões e abusos  físicos e verbais especialmente quando mantém João preso.  No momento da grande virada da história, em que João resolve mantê-lo como refém para soltá-lo e depois resolve mata-lo com um tiro, pode se dizer que mesmo que esta não seja a maneira mais correta de resolver fazendo justiça com as próprias mãos, ainda assim  você consegue entender as suas motivações e pode-se dizer que dá para vibrar pelo fim que ele deu ao desprezível delegado. O uruguaio Cesar Troncoso na pele do Pablo, o primo peruano de João também mostrou um excelente  desempenho em todo o arco dele na história ao apresentar o submundo da criminalidade a João como forma de enriquecer mais fácil, mas muito perigoso na venda das drogas que ele planta na região da Ceilândia. Para encerrar a parte do elenco, não podia deixar passar a participação de Marcos Paulo na pele do Ney, pai da protagonista Maria Lúcia, desempenhando perfeitamente o personagem neste que foi seu trabalho póstumo, ele faleceu em 2012 vítima de uma embolia, em decorrência da sua batalha contra um  câncer de esôfago. Um engravatado deputado, magistrado ou mesmo executivo não fica claro  qual a sua  profissão. Mas que de todo jeito mostrou um boa representação dele como, além de  um pai omisso, mas também um sujeito preconceituoso  e desprezível,  isto ele desempenhou  brilhantemente  mostrando uma ótima entrega ao papel na cena quando flagra Maria Lúcia no quarto com João e este completamente enraivecido resolve    expulsar sua própria filha  de casa. Nesta que foi sua última cena no longa. Uma despedida primorosa. 















Outra coisa legal a se destacar está na magistral trilha musical onde podemos ouvir muitos revivals de canções contagiantes que foram sucesso  nos anos 1980, especialmente nas cenas que se passam nas boates. Uma dessas bem interessantes que mais chamou a atenção que é tocada entre uma cena e outra é a contagiante  These Boots Are Made for Walkin´, sucesso da Nancy Sinatra nos anos 1960. 







No balanço geral, Faroeste Caboclo é um bom filme dramático, com toques de romances e suspenses, inspirado numa canção emblemática da Legião Urbana que traz bem um reflexo-critico-provocativo  muito atemporal sobre a nossa juventude brasileira regrada a uma vida promiscua sem uma convivência afetiva familiar como é o caso dos protagonistas e que tendem a cair facilmente no mundo mundano.  Outro fator importante que o filme também apresenta é que preservou muito a essência da canção é uma curiosa alegoria crítica, que é justamente ao fato do filme representar uma Brasília que não é mostrado a população brasileira  nos noticiários da TV com os jornalistas descrevendo a rotina de trabalho dos nossos políticos, seja do Presidente da República, dos Deputados e Senadores  aprovando emendas, comissões, leis  ou mesmo  montando CPIs (Comissões Parlamentares de Inquéritos), ou mesmo na atuação do judiciário. A Brasília que é descrita na canção é isto o filme conseguiu preservar muito bem é de um lugar onde reside as pessoas comuns cuja existência é ignorada pelos nossos políticos, a prova disso é a existência da Ceilândia, um lugar pobre, sem saneamento básico que é facilmente  imperado pelo crime organizado  e sendo como nos filmes dos faroestes americanos, uma Terra Sem Lei, onde  cada um pode fazer a justiça com as próprias mãos já que até mesmo profissionais que deviam fazer a lei como a polícia também se corrompem. Para este momento atual em que vivemos um clima tenso em nossa atual política, a abordagem deste filme serve bem como uma reflexão.

terça-feira, 16 de outubro de 2018

VENOM SEM HOMEM-ARANHA








Olá Grandes Super-Heróis, na noite de domingo, 07 de Outubro, fui conferir ao tão aguardado filme do Venom. O Filme solo inspirado no famoso simbionte que compõe a galeria de vilões do Homem-Aranha. Confesso que até pouco tempo  eu estive bastante receoso, porque tipo se a gente lembrar que uma das razões para  este filme ser rejeitado por boa parte do público  está no fato  de sua  produção  ser da Sony, e que, portanto,  não compõe o UCM. E que se a gente lembrar que não faz muito tempo que esta mesma Sony já tinha incluído este personagem em Homem-Aranha 3 cujo resultado desagradou e muito ao público e a crítica. Especialmente pela forma bastante destoante ao qual ele foi incluído no contexto da história.  Um alienígena originado da saga cósmica dos quadrinhos dos anos 1980 Guerras Secretas onde este ser simbionte virou o hospedeiro do Peter Parker que fez ele adquirir um uniforme preto que lhe que lhe deu mais poder, força e modificava sua personalidade e nisto para poder tirá-lo ele sabendo de sua fraqueza por ruído resolve expô-lo no teto de uma igreja  num sino tocando onde lá ao conseguir tirá-lo termina coincidentemente encontrando como hospedeiro o Eddie Broke, o seu invejoso  colega do Clarim Diário que mostra-se ser um profissional bastante antiético no jornalismo na hora de procurar algum furo de reportagem.    Na celebre trilogia do Sam Raimi esta parte sequer tinha sido trabalhado e o diretor do jeito que não era muito fã do personagem, acabou cedendo por pressão do estúdio que criou uma trama pífia que piorou com o desempenho medíocre na pele  de Topher Grace como Eddie Broke em cena  e tipo só por isto ninguém botava muita fé  que um personagem que não era herói, e nem mesmo um anti-herói, mas um ser parasitário espacial cujo único objetivo é apenas de encontrar um hospedeiro para se alimentar e fortalecer, pudesse não ser o suficiente para   sustentar um filme todo nas costas, sem fazer menção ao Cabeça de Teia.  Nesse filme solo dirigido pelo Ruben Fleischer, a gente pode notar logo de cara que ele não apresentar nenhuma ligação com o universo do Cabeça de Teia e nem mesmo com o UCM quando percebemos que o local em que o cenário será ambientado não é em Nova York, mas sim em São Francisco. Onde será que vai ocorrer toda a ação da trama. Antes disso, temos uma premissa que mostra um foguete caindo do céu e lá é mostrado um dos simbiontes saindo se hospedando no corpo de várias pessoas até chegar a São Francisco é nesse lugar que mostra Eddie Brocke trabalhando atuando como repórter para uma emissora de TV local.  Ele então é mandado pelo seu chefe para fazer uma reportagem com Carlton Drake(Riz Ahmed), o dono de um laboratório que se utiliza dos simbiontes para uma prática ilegal usando seres humanos como cobaias. Foi nessa reportagem que ele comete uma grande gafe ao falar das investigações em pleno momento que estava gravando que colheu por conta própria que mostrava as falcatruas do laboratório. E isto termina resultando na  perda do seu emprego, também no fim do seu casamento já que sua namorada Anne(Michelle Williams) também caiu no prejuízo por ter perdido o emprego nesse mesmo laboratório. Nisso a história em sua vida  completamente lascada, ferrada atrás de um novo emprego muda quando de repente acontece do simbionte terminar se hospedando em seu corpo  e dessa forma temos o filme mostrando a jornada do simbionte como hospedeiro em um corpo humano tentando se adequar aos estilos de vida de cada um até chegarem ao clímax de enfrentarem um outro simbionte mais perigoso que o próprio Venom.

Antes de ir conferir ao filme, eu tinha visto vários comentários críticos sobre este filme e boa parte foi bastante negativa. De fato pelo que pude constatar, não tiro  as razões para a critica especializada não ter gostado  desse filme. Primeiro a mudança da classificação indicativa que prometia ser R-Rated, o que poderia ter dado um ótimo resultado em explorar um nível de violência mais gore, num personagem que é puramente violento, a nível de sadismo e de canibalismo. Mas ai mudaram para PG-13, para ficar mais acessível de ser assistido e você pode perceber  o quanto a edição retalhou bastante algumas cenas que exigiam um nível de violência mais barra pesada.  Fora também há o problema do roteiro ser  raso e medíocre, onde você nota eles  repetirem a mesma preguiça como colocou na franquia de O Espetacular Homem-Aranha da ameaça sair de um laboratório, o que por si só já representa uma ideia bastante duvidosa. O texto dos diálogos são também bastante sofríveis, eles oscilam as mudanças entre um filme de um suspense  mais creepy, com momentos que acabam causados muitos risos involuntários. Fora também os problemas das construções dos personagens que são muito pífios.  Tom Hardy no papel principal até que está ok, convence sua completa entrega as camadas dos personagens, mesmo sua construção ter ficado rasa pelo roteiro, e a maneira como a caracterização em  captura de movimento digital bem convence e até consegue  provocar medo  mesmo deixando evidente algumas falhas de edição, mesmo assim as movimentações dos frames do rosto do Venom ficaram perfeitas e bem convincentes. A única coisa que mais me incomodou foi nas cenas em que o personagem devora as cabeças, não aparecer sangue. Isto devido a mudança de classificação que não deixou explorar um nível de violência mais gore. Já Riz Ahmed como o antagonista Carlton Drake, faz um desempenho bastante medíocre de tão canastrão e caricato a ponto de parecer muito robótico. E a Michelle Williams como a Anne, namorada do Eddie, também tenta algum esforço para desempenhar o papel dela que procura ajuda-lo no momento mais difícil da vida do Eddie, mesmo a personagem ficando tão rasinha  e limitada pelo roteiro, a ponto de parecer uma inútil na trama. A direção do Ruben Fleischer também se mostra bastante confusa, ainda mais pelo roteiro fraco. O que de certa forma, apesar dos que aqui coloquei muita coisa  de negativo, isto não parece ter afetado a bilheteria, pois  até o momento em que estou filmando esta crítica, o filme conseguiu arrecadar US$205 Milhões de dólares. O que pelo menos já dá uma garantia para uma sequência de um filme que se mostrou bastante ambicioso para uma proposta arriscada como essa, em fazer um filme de um vilão tão complexo da galeria do Cabeça de Teia.  De tudo isso, os únicos pontos que o filme apresenta e que ainda valem a pena de se assistir é a presença do Stan Lee e as duas cenas pós-créditos que são sensacionais. Se quiserem é só irem conferirem ao filme.





segunda-feira, 15 de outubro de 2018

SOBREVIVENDO COM LOBOS-A SOBREVIVÊNCIA DA INTOLERÂNCIA


Nesta época  tão sombria que anda ocorrendo nesta eleição em nosso pais, onde nesse momento de crise, boa parte da população brasileira tem transformado um sujeito com ideias intolerantes as minorias  como o Salvador da Pátria é nesse clima que é bom mesmo comentar sobre um filme que aborda o quanto que uma ideologia de intolerância pode prejudicar muita gente, especialmente para uma garota judia em plena Segunda Guerra Mundial como o retratado no filme Sobrevivendo com Lobos( Survivre avec les loups, França, 2007) .É como posso definir, um excelente de exemplo de  filme com essa abordagem, cuja estética é inigualável. 






Um interessante enredo que nos apresenta em tom reflexivo sobre o limite da nossa própria sobrevivência. No primeiro ato  do filme, começa se passando em 1942, mostrando Misha acompanhada de seus pais se  abrigando  numa casa da periferia  de Bruxelas, capital da Bélgica. Fugindo do nazismo, vivendo na clandestinidade e sendo orientada pela mãe a quando aparecer uma pessoa se aproximando dela contando o código "amor da minha vida" é porque simboliza um sinal de que ela deve acompanhar esta pessoa quando os pais não tiverem por perto. Também apresenta ela tentando se adaptar aquela nova rotina tentando parecer a mais normal possível.  Falsificam o registro dela  para que ninguém soubesse que era judia. 












Até chegar o momento em que quando ele ao sair da escola descobre que os pais não estavam lá, e então uma senhora aparece e menciona "amor da minha vida". É então que ela se depara com o perigo e vai a acompanhando até uma casa na zona rural sendo acolhida por uma família, que  aparentam não  estarem muito feliz com este gesto de caridade em abriga-la. É então que ocorre o segundo ato do filme, onde mostra a vivencia dela  neste abrigo numa fazenda onde ela se  dividi entre a família que a abriga, e o Ernest um simpático senhor que é vizinho desta família por quem ela se afeiçoa e passa a viver com ele. Principalmente com os casais de cachorros Mamãe Rita e Papai Ita. Um homem que por trás daquela simpatia, esconde um lado mais dramático que foi ter perdido um filho quando foi combater na guerra, e isso deixou sua esposa Marthe além de abalada, enlouquecida a ponto de sempre achar que ele está voltando.  










É  a partir do momento em que Misha ao observar as tropas invadindo a fazenda. Que tem início o terceiro ato do filme que é aonde se desenvolve a sua jornada solitária pela floresta, fugindo dos nazistas. As únicas companhias que ela conta nesta jornada são Gerusha, a boneca que ela ganhou de Marthe, e uns bandos lobos que ela observando umas fortes semelhanças a Mamãe Rita e Papai Ita, os chama desse modo.

É também ao longo desta sua errante jornada solitária pela floresta, vivendo uma vida de criança  selvagem onde ela perde completamente a noção do tempo e nem faz ideia que tenha passado pela Alemanha, Polônia  onde se deparou com muitos perigos, muitas hostilidades, foi atingida por uma pedrada de um fazendeiro, quando invadiu a propriedade deste para comer. Esteve envolvida com outras crianças que estavam fugindo das tropas, e viu o casal de lobos por quem ela se afeiçoou serem mortos pelos caçadores, até concluir a partir do momento em que ela aparece na Ucrânia em 1944, que é onde ocorre  o terceiro ato do filme.  É numa abandonada e destruída cidade-fantasma  ucraniana que Misha completamente exausta cai no chão para dormir e lá tem o delírio da lembrança do seu pai. Principalmente ao sentir alguém lhe carregando, ela pensa ser seu pai, mas na verdade era um soldado russo, que não por acaso também se chamava Misha.







Neste momento a menina se mostra arredia quando o soldado Misha a leva para o esconderijo dele, provavelmente pelo longo tempo que passou caminhando na floresta e tendo de sobreviver com o que podia, e principalmente aguentar os invernos rigorosos e com a convivência das alcateias então.  E então que vemos o desenvolvimento do quarto ato onde apresenta a vida rotineira de Misha neste abrigo com as tropas russas, onde ela se mostra muito arredia em não querer se comunicar com eles. No momento em que ambos estavam reunidos vendo uns filmes de noticiários sobre a guerra, e quando é apresentado um bombardeio  da resistência de Bruxelas é então que ela reage e grita, já deixando claro  para estas tropas um sinal de onde ela vem. Dai então temos o fim do quarto ato, mostrando com a conclusão com o quinto apresentando Misha voltando para casa, desta não encarando a floresta novamente, mas num trem, e perigosamente debaixo dos trilhos. Assim que chega na antiga casa do bairro, acha estranho o ambiente ter mudado, é então que a senhora dona da propriedade a aconselha ir para a prefeitura para pedir informação e encontrar os paradeiro dos seus pais. O que termina sendo em vão, até que ela acaba ficando lá para receber uns tratamentos médicos que a deixam em delírio.

É então que o filme termina com o velho Ernest aparecendo para assumir a tutela da menina e trazendo para a sua  companhia o Papai Ita e da Mamãe Rita.

O filme com direção de Vera Belmont carrega uma história bastante reflexiva de como numa situação dessas ou mesmo a que  ponto do limite pode chegar ao extremo, em consequência da falta de humanidade e de tolerância das pessoas. Ele teve seu roteiro inspirado  em um livro de memórias da Misha que foi publicado em 1997, que ela depois disse que não eram verdadeiras, mas independente de ser ou não verdadeira, ainda assim transmiti muito bem o sofrimento, as provas e as expiações que temos de lidar quando uma sociedade intolerante nos persegui por sermos diferentes. 








Um filme que representa bem uma temática como com cunho de obra de arte. Diferente de alguns clichês hollywoodianos que costumam exaltar neste tipo de filme, uma visão romanceada com a figura dos soldados no combate, como os salvadores do mundo, com os americanos sendo o  arquétipo do Capitão América  e os alemães como o arquétipo do  Caveira Vermelha. Neste aqui é o contrário, ele nos apresenta um cenário desse tumultuado conflito pelo ponto de vista de uma pessoa comum, uma menininha que sofreu muito por não ter tido uma infância feliz, por ser diferente, por causa de um sistema político que pregava o ódio, a intolerância, queria que todos fossem iguais loiros do olho azul e fossem arianos. Numa trama muito violentamente densa, principalmente pelo aspecto psicológico que passa a Misha, um bom filme reflexivo para quem "Não conhece a sua história, está condenado a repeti-la", como bem descreve o filosofo irlandês Edmund Burke(1729-1797).  E no caso em tempos como os de hoje que a cena vive neste cenário político  delicado no Brasil nesta eleição, com todo mundo se xingando e perdendo amizades por paixões ideológicas  partidárias e até se violentando com muita barbárie, é até recomendável  assistir  um filme desse e imaginar as consequências que isto volte a causar, e que pode ser muito pior que o nazismo.

sábado, 6 de outubro de 2018

CHATÔ- O REI DO BRASIL-O POLÊMICO FILME ATRASADO PELA BUROCRACIA.




Se você perguntar a qualquer pessoa se ela curte cinema nacional? A resposta óbvia seria não, por achar as produções nacionais   muito inferiores das hollywoodianas. O que não é para menos, do jeito que nossa produção audiovisual sofre por depender de órgãos governamentais para captar recursos e patrocínios de empresas públicas e privadas para entrar no processo de pré e pós-produção, é portanto compreensível que uma boa parte da população brasileira veja com forte preconceito a nossa produção nacional, eu mesmo tive este tipo de preconceituosa sobre a nossa produção audiovisual. Especialmente se a gente for analisar a nossa história cinematográfica que foi bastante prejudicada por diferentes governos, como a ditadura, por exemplo, que atrapalhou nossa produção audiovisual com a censura e para driblar a censura tivemos de nos adequar produções de baixo orçamento e de apelo popular como foram as pornochanchadas que contaram como grandes estrelas astros do alto escalão da Rede Globo. E logo depois no Governo Collor onde ele prejudicou a nossa produção ao cortar as verbas e as captações de recursos foi então que passamos por período negro de nossa produção nacional. 






Só a partir de meados dos anos 1990, que é quando tivemos a retomada foi que a produção do cinema nacional conseguiu voltar a ganhar o respeito dos brasileiros que não se tinha antes, especialmente na boa qualidade das histórias e nos enquadramentos de cenas. Porque vamos dizer que a pornochanchada ajudou a criar uma horrível imagem  de piada do nosso cinema. Já que praticamente não havia história, era só ir na sacanagem.












E se  há um exemplo de filme nacional que se pode destacar como um exemplo de história horrível especialmente pelo tempo que levou ficando vintes anos no limbo devido aos constantes problemas na produção que ocasionou  na má fama que o seu diretor levou de picareta, sonegador fiscal por mau uso dos recursos captados  para o   filme em questão que  é Chatô-O Rei do Brasil(Brasil, 2015). 










A jornada desse problemático filme ter levado um longo tempão para ser concluído e só então chegar aos cinemas após duas décadas de incertezas. Tem inicio quando em 1995 o diretor Guilherme Fontes, na época um ator cuja carreira estava em alta na Rede Globo por vim de uma sequencia de novelas de sucesso como Mulheres de Areia(1993) e A Viagem(1994), foi atrás de captar recursos para adaptar o livro homônimo do jornalista Fernando Morais publicado em 1994, um expert e grande referência em escrever livros biográficos sobre grandes personalidades brasileiras. Guilherme ficou bastante apaixonado ao ler este livro do jornalista que contava a trajetória do grande magnata da comunicação no Brasil Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Mello(1892-1968), vulgo conhecido como Assis Chateaubriand. Considerado o Cidadão Kane Brasileiro, um homem que ao mesmo que era respeito como jornalista e também empresário da comunicação, criador dos Diários Associados, da Rádio Tupi e da pioneira e já extinta TV TUPI. Também foi visto como um sujeito bastante polêmico, especialmente nas controversas posições politicas ao qual tanto criticava em seu jornal. Nascido em Umbuzeiro, na Paraíba. Batizado de Francisco de Assis, em referência ao fato de ter nascido no dia 04 de Outubro, dia dedicado ao santo e o Chateaubriand é de origem na homenagem que seu pai Francisco José tinha pelo poeta francês Francois-René de Chateaubriand(1768-1848) que tem uma linda frase reflexiva que diz respeito às ciências e aos sentimentos: “As ciências explicam tudo para a inteligência e nada para o coração”.  Formado jornalista e  magistrado, Chatô também atuou como político,  mecenas e também tornou-se membro da Academia Brasileira de Letras. Por trás da figura imponente  de um magnata da comunicação que ele transmitia, também havia a figura de um sujeito com uma personalidade muito egocêntrica, autoritária, ainda por cima um mulherengo   e que pouco ligava para a família. Ou seja, sua vida pessoal estava longe de ser um exemplo de  perfeição, o que contrastava com a sua mítica imagem de o poderoso chefão das comunicações brasileiras. Longe de ser uma perfeição está também no que pode se descrever sobre este filme que retrata a sua biografia. 








A começar pelo fato da maneira como a trama foi construída é bastante confusa, uma verdadeira colcha de retalhos. A bagunça  fica evidente  desde o começo, onde pela premissa podemos bem observar uma grande confusão da narrativa não-linear que começa mostrando o Chatô(Marco Ricca) numa limusine vendo a coroação da Rainha Elizabeth II, em seguida, temos o corte para a cena dele no hospital e nisso temos umas variedades situações aleatoriamente confusas, como por exemplo de repente ele está participando de um programa de auditório onde está passando por uma espécie de tribunal para ser julgado em um tom muito galhofa e canastrão. Depois a trama vai rapidamente apresentando fatos da vida do Chatô, de sua humilde infância no interior da Paraíba, passando por sua vida adulta sonhando alto em trabalhar como jornalista e ser proprietário de seu próprio meio de comunicação, dos seus momentos de glória e queda, a trama vai oscilando  muito no tom a ponto de ficar um filme muito Frankstein. Hora fica cômico demais, especialmente quando mostra Chatô agindo em situações muito absurdas, hora também fica muito dramático a ponto de não conseguir encontrar a dose certa e muitas delas até inverossimilhantes demais dentro do contexto apresentado na obra.  Muito disso consequência dos problemas de edição, devido a este limbo durante a produção onde ele adiou algumas datas de filmagens, fora também o fato do texto está bastante deslocado com as situações apresentadas nas cenas e todo este atraso de vinte anos de lançamento ocasionou de Guilherme Fontes ficar com o nome sujo na praça, já que o Tribunal de Contas da União o acusou de sonegação fiscal e como multa teve de devolver a boa parte do que foi investido, o que resultou no atraso de lançamento deste filme e gerou até suspeita que isto não passava de uma pura picaretagem. 






Parece que Guilherme Fontes errou bastante a mão ao se arriscar em dirigir uma produção dessa magnitude, ainda mais sendo uma cinebiografia de uma pessoa importante como Assis Chateaubriand. A quantidade de erros crassos de produção é tão grande de tão tosco e absurdo  que ficou. Como se não bastasse o roteiro confuso com uma narrativa  não linear, com um texto cheio de diálogos confusos e fora de tom, mesclado a edição cheia  de cenas muito retalhadas e a própria atmosfera indefinida utilizando-se do exagero da extravagancia, que são frutos da liberdade criativas que Guilherme Fontes não soube  como executar. A sensação que dá é que a ideia  no papel se mostrava perfeito, mas na hora da execução terminou ficando bastante problemático. Fora também que o filme apresentou um ritmo bastante fragmentado, com trechos acelerados e outros lento demais a ponto de ficar entediante e a falta de contextualização, especialmente nos momentos importantes da História do Brasil que contou com a colaboração de Chatô, como o seu controverso relacionamento de amizade com Getúlio Vargas(1882-1954), então Presidente do Brasil deixam o espectador bastante deslocado e confuso dentro daquele contexto apresentado no filme, a ponto de gerar aquele estranhamento de pensar assim: será que de fato aquilo aconteceu na vida do Chatô? Outro problema também terrível do roteiro, foi na maneira como foi construída a personalidade do próprio Chatô, sendo ele representado de uma forma muito extravagante, beirando ao ridículo de tão estereotipado e caricato que ficou a ponto mais parecer uma versão satírica. Marco Ricca na pele do Chatô até que não ficou ruim no papel, ele bem se esforça para desempenhar todas as nuances e camadas que envolvem a complexidade de uma figura como Chatô. O grande problema está é na maneira como o texto mal construiu a personalidade dele, a ponto de na forma caricata como ele representou Chatô, principalmente nos momentos de raiva,  agindo como um típico nordestino arretado, cabra da peste, pegando no facão e com uma fonética de sotaque carregado fez ele mais parecer uma patética representação de imitação barata em um típico programa  humorístico. Além de Marco Ricca, o elenco do filme também contou com um elenco estelar, formado por alguns  Star Talents de novelas da Rede Globo, como por exemplo, Paulo Betti na pele do Getúlio Vargas onde ele desempenha uma personalidade dele como um sujeito bastante articulado e como sabia agir como uma verdadeira raposa na política, apesar de em alguns momentos poder-se notar um jeito forçado e até beirando ao caricato que faz ele mais parecer um comediante fazendo sátira do Getúlio. Mesmo contando com a presença  destes, não  mostram peso   suficiente para segurarem o filme, que carrega uma estética bastante fragmentada a ponto de ficar muito confuso com tantas colchas de retalhos que foram feitas, a ponto de se observar muitas mudanças de tom  e com as edições confusas então nem se fala. Hora ele apresenta uma cena do Chatô em coma que tem momentos que cria um clima do tom  bastante pesado pela carga dramática, de repente eles cortam para o momento do devaneio de Chatô de auditório onde o cenário colorido das paletas de cores muda completamente o tom indo para o humor galhofa, canastrão, extravagante em um ambiente com toque bem carnavalescos, toda esta tosquice apresentada no filme  me faz chegar a conclusão dele representar a maior vergonha alheia do cinema nacional de todos os tempos.

terça-feira, 2 de outubro de 2018

FILME MORANGO E CHOCOLATE E SUA CRÍTICA AO REGIME CASTRISTA


Nestes tempos em que temos visto tanta pregação de ódio aos diferentes com toda esta polarização política neste tempo conturbado de eleição presidencial em um tenso cenário  de muitas incertezas. É bem apropriado comentar de um filme que traz este tipo de abordagem de uma forma até sutil como é no caso do cubano Morango e Chocolate (Fresa y Chocolate, Cuba, Méx, Esp, 1994)  dirigido por Tomás Gutierrez Alea(1928-1996) em conjunto com Juan Carlos Tabío. O enredo de Morango e Chocolate ambienta-se no ano de 1979, na capital Havana. Gira em torno do jovem universitário David(Vladimir Cruz), ainda não muito conformado com o fim de seu noivado. Conhece um dia, numa sorveteria Diego(Jorge Perrugorría), um artista assumidamente gay e descontente com o regime castrista.


















Diego tenta diversas vezes se insinuar para David tentando obter alguma conquista, só que ele se mostra resistente. Será nesse encontro casual, o ponto inicial para o desenvolvimento da trama.












David se sentindo forçado resolve acompanhar Diego até sua casa, lá fica admirado e ao mesmo tempo espantado com a quantidade de livros que ele adquiriu nas prateleiras da sua casa. O impressionante  detalhe explorado nesse momento do filme  é quando o estudante universitário David explica para  Diego que boa parte desses livros ele nunca tinha lido e nem muito menos ouvido falar, porque eram obras proibidas, censuradas pelo sistema. Será nessa e em muitas outras cenas mais para frente de David visitando a casa de Diego, que será observado uma sútil crítica de como a população cubana lida rotineiramente com a opressão imposta pela ditadura castrista.



E um desses momentos muito frequentes no filme, é quando Diego ao ler um dos livros em voz alta para David, liga um som com toca-fitas em um volume altíssimo, o motivo era para os vizinhos não ouvirem aquela sua leitura, porque se o ouvissem os denunciariam para o Governo.























Também será no decorrer e desenrolar do filme que irá aparecer uma terceira protagonista Nancy(Mirta Ibarra). Uma mulher cuja profissão não é bem esclarecida, há quem pense que ela se trate de uma prostituta como bem sugere uma cena dela recebendo grana de uma garota de programa. Tudo em torno de Nancy é um enigma. Vai ser a Nancy a responsável por conquistar o coração de David, coisa que Diego não consegue, mas no entanto Diego consegue obter uma conquista muito melhor de David, que é a amizade e o respeito. Especialmente quando este resolve defende-lo de uma briga onde ele sofre uma imensa discriminação por sua orientação sexual.










A trama do filme de Alea pertence ao gênero de uma comédia dramática, que fez história por ser o primeiro filme a representar  Cuba na disputa do Oscar de 1995 a categoria  de melhor filme estrangeiro,  onde perdeu para o russo O Sol Enganador. Venceu vários prêmios em festivais,  entre eles  o Festival de Berlim como o Teddy, Urso de Ouro e o Urso de Prata e o Prêmio do Público e o Kikito de Ouro no Festival de Gramado. Esse filme  foi o penúltimo dirigido pelo Alea, que um ano antes de morrer dirigiu Guantanamera(1995).  Considerado o nome de maior expressividade na ilha caribenha, que além desse também carrega um extenso currículo de outros bons filmes já dirigidos.



















Em Morango e Chocolate,  dá para perceber, alguns interessantes  detalhes do texto  que moldam e pincelam o retrato incoerentemente mascarado  de um país que há 50 anos é regido por um sistema de governo que teoricamente segue os princípios do socialismo criado por Karl Marx(1818-1883), onde defende os princípios de uma sociedade igualitária e mais justa, mas que na prática a coisa é completamente diferente. 















Os três protagonistas do filme: David, Diego e Nancy pincelam de maneira sucinta, o retrato mascarado da realidade envolvendo esta ilha caribenha, admiradas por muitos como bom  exemplo no sistema educacional, na saúde e também no incentivo aos esportes.



Mas que apesar de ser um bom exemplo, também tem lá suas imperfeições que são ignoradas. O universitário David, por exemplo, faz uma sutil crítica a maneira como o sistema educacional no país é ao mesmo tempo exemplar, fazendo com que a ilha caribenha tenha o menor índice de analfabetismo. Também carrega uma característica dúbia em relação quanto ao governo só permitir que as escolas ensinem o que seja favorável para eles, o que não for é proibido. Isso explica o motivo pelo qual David ficou bastante surpreso ao olhar e tomar conhecimento através de Diego de livros que ele nem imaginava existirem. Diego pincela um retrato curioso, representando uma camada da população da ilha que poucos conhecem ou nem mesmo imaginam ocorrer nesse lugar que segue há 50 anos um sistema político que teoriza a igualdade.  São as camadas dos gays que lidam com o preconceito. Difícil acreditar? Mas, infelizmente o filme aborda através de Diego a visão dúbia que até num país como Cuba também ocorre a prática de preconceito. E no caso do Diego, só o fato dele ser gay o tornar alvo de discriminação social, o que hoje é  denominado de homofobia.



















E por fim, a Nancy pincela um retrato curioso de uma camada social cubana, como  descrevi acima, ela é bastante enigmática e a explicação para isso está no fato da personagem representar  um retrato de uma agente do Governo Cubano infiltrada em determinados bairros para colher informações sobre supostos subversivos, e o Diego era quem ela tinha a missão de ficar observando. A primeira vez que Nancy aparece no filme é na curiosa cena dela sofrer uma queda de pressão na rua e é socorrida pelos dois que a colocam numa ambulância e ao chegarem num hospital para onde Nancy é atendida, ocorre uma outra visão crítica e cômica a respeito da incoerência  do país que representa o melhor exemplo de competência na área da saúde, exportando até médicos para outros países, em seu próprio território os hospitais viverem numa carência e escassez tecnológica, como bem é mostrado na cena de Nancy ao ser atendida para receber uma transfusão de sangue, e para Diego e David conseguirem isso descobrem que o grande obstáculo é a falta de aparelhos e seringas necessárias para isso.



Também é curioso ver uma cena onde Nancy faz uma reza para os santos, se benzendo em banho de água benta pedindo para ter David aos seus braços. O que representa uma interessante visão de mesmo o país sendo regido há 50 anos por um regime totalitário ateu,  ainda existe uma boa parte da população mantém preservado a fé e ainda alguns costumes religioso  de mantê-la viva, como faz Nancy. E a própria mostrar que nesse país também se pratica a prostituição, apesar de ser exemplar em tudo.















Tenho de admitir que Morango e Chocolate foi o primeiro contanto com um filme cubano. Na primeira vez  que assistir a este filme que foi numa sessão alternativa promovido por Antonino Cordorelli no projeto Café com Cinema no auditório da  antiga livraria PotyLivros ocorrido em 2012. Naquela ocasião, durante os debates ocorrido após o fim da sessão  tanto o coordenador do evento quanto alguns presentes  haviam compartilhados suas experiencias de quando foram   visitar Cuba por motivos de trabalho e lá relataram de terem se deparado com situações idênticas que sucintamente pincela, a outra face da Cuba castrista.  Foi bastante curioso ouvir relatos, seja da plateia, ou mesmo, do próprio Antonino Cordorelli, o responsável pelo evento. Alguns detalhes curiosos sobre como a população lida diariamente com a opressão desse governo totalitário, e uma das maneiras como eles procuram driblar como o filme bem mostra em tom de crítica muito sutil  na cena de Diego lendo para David em voz alta é ligando o som alto para os vizinhos não ouvirem e o denunciarem. Foi durante a discussão, que ouvi os exemplos das populações driblarem seja em espaço público   ou mesmo dentro do lar através de códigos. 















Morango e Chocolate trata-se de uma primorosa obra-prima para a gente analisar as coisas que a gente acredita como verdade com outros olhos. E principalmente refletir que o acesso ao conhecimento da maneira que for nos abre a cabeça.   É um interessante filme que serve para a gente conhecer e entender um pouco da realidade cubana, independente de qual ponto de vista for analisado. Uma coisa é certa: Morango e Chocolate defini Cuba por ela mesma.